Estar apaixonado é uma experiência indescritível. Os sentidos começam a nos enganar, o raciocínio fica para lá de relativo e as coisas deixam de fazer sentido. Esse estado de êxtase caracteriza com precisão não só a relação entre o apaixonado e a pessoa amada como é uma metáfora perfeita para o caso de amor entre o Placebo e os fãs da banda inglesa – as letras atormentadas e a atmosfera soturna da parceria criada por Brian Molko e Stefan Olsdan foram a paixão de inúmeros fãs encantados pela música dark do grupo.

O grupo, que tem seis álbuns na bagagem, desembarcou no Brasil esta semana com a turnê de divulgação de seu trabalho mais recente, Battle For The Sun. E, assim como o álbum representou o ocaso da paixão intensa dos fãs mais radicais em relação ao grupo, a turnê do trabalho menos melancólico dos ingleses traz um gostinho amargo de decepção: por mais que tudo pareça perfeito, a relação chegou naquele ponto em que o amor absoluto deu lugar a uma saudade – e a vontade irresistível de seguir em frente.

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Acompanhados por Fiona Brice (violino, teclado, theremin e vocais de apoio), Nick Gavrilovic (teclado, guitarra e vocais de apoio) e Bill Lloyd (baixo e teclado), o vocalista Brian Molko, o baixista Stefan Olsdan e o novo baterista Steve Forrest entraram no palco exatamente às 22h com For What It’s Worth, primeiro single do álbum Battle for The Sun

É inegável o talento do Placebo em cima do palco – após uma parceria que já dura 16 anos, Brian Molko e Stefan Olsdan não precisam mais nem ensaiar seus passos e seus acordes, de tão instantânea que parece a compreensão entre suas performances. Tecnicamente, tudo perfeito: o setlist, que equilibra novas músicas, como The Never-Ending Why e Ashtray Heart, com hits assobiáveis como Every You Every Me, Meds e Come Undone, a presença de palco dos músicos, que sabem muito bem o que estão fazendo, a reação do público, que não parava de gritar e pular ensandecido… tudo apontava para um show incrível.

Então, por que tudo parecia tão mediano? E a paixão, o amor, o deslumbre com todas as músicas climáticas e emocionantes que caracterizavam o Placebo? Não é uma questão de envelhecer bem ou mal, porque o grupo comprovou que é possível continuar junto após 16 anos de estrada tocando com a mesma técnica. É a ausência da criatividade que faz com que o show da nova turnê seja apenas mediano. Battle For The Sun é um álbum que soa muito mais otimista do que a carreira anterior do Placebo, e esse é o diferencial do CD. Mas, no palco, tudo parece mais do mesmo – e a inovação que é anunciada nos estúdios não é cumprida nos palcos.

Por sorte, Brian Molko e Stefan Olsdan conseguiram comandar a pequena plateia do Credicard Hall (provavelmente devido aos preços abusivos, a Pista Premium do show estava quase vazia) com maestria, usando e abusando das guitarras e da bateria de Steve Forrest (que, aliás, merece aplausos por sua apresentação irretocável). Infelizmente, a acústica da casa não ajudou, sem contar que no começo do show era muito difícil ouvir a voz de Brian Molko, que se perdia em meio aos demais instrumentos. 

A plateia do Credicard Hall saiu satisfeita após uma hora e meia de um show correto e sem surpresas, que evidenciou dois fatores: a capacidade inegável dos músicos do Placebo na hora de fazer boa música e o perigo de se investir em um futuro sem inovações. Se o Placebo não trouxer aos palcos uma turnê que consiga driblar a nostalgia e a vontade de celebrar um passado que não vai retornar, o perigo continua lá – a transformação de uma banda ícone de uma época em um dinossauro que vai para sempre ficar no armário dos CDs velhos. E, como todo mundo sabe, a gente só continua amando aqueles que conseguem despertar a mesma paixão em qualquer época.


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Placebo faz show correto em São Paulo, mas deixa um gosto de nostalgia que não cai bem