Lembra daquela sensação de ficar refestelado no sofá, zapeando a TV por aqueles 100 canais da TV a cabo e não encontrar nada de útil? Por muito tempo, essa foi a postura do telespectador mundial. Éramos reféns da grade televisiva: tínhamos de nos contentar com reprises até dizer chega, ir dormir com o Jô Soares, acompanhar algum programa estrangeiro com meses de atraso… O telespectador era um ser passivo. Com a revolução do vídeo, encampada pelo YouTube, tal postura virou ativa.

Com a banda larga se expandindo e ficando mais veloz, a transferência de vídeos pela internet ganhou força. Se no começo da década um vídeo de 1 minuto levava horas para ser baixado (e ser visto em uma qualidade sofrível), alguns anos depois um vídeo de 1 minuto leva, veja só, exatos 60 segundos para ser visto via streaming. Criou-se a partir daí o hábito de usar o monitor do computador ou a tela do notebook para o consumo audiovisual. No começo eram vídeos amadores, gravados com câmeras de celular e de máquinas digitais. Agora são vídeos profissionais, em alta definição e o escambau.

Dessa forma, foi natural a passagem de se começar a ver televisão pela web. Para que estar em casa no domingo à noite para olhar o Fantástico, se no dia seguinte há trechos dele na internet? Para que esperar pela nova temporada de uma série na TV a cabo no mês que vem, se amanhã um episódio inédito dele está no PirateBay, em 720p e com legendas em português? Dá até para vê-lo ao mesmo tempo em que o telespectador americano, ao vivo, via live streaming.

Essa pirataria fez os produtores e os executivos da TV se adaptarem. Lost, por exemplo, terá seu último ano estreando na TV a cabo brasileira apenas uma semana depois de ele começar nos EUA. Antes, a diferença era de um a dois meses. Com o forte impacto dos fãs fazendo download de seus programas favoritos, as emissoras também tiveram de criar opções legais para atender a esse comportamento. Vide os portais de vídeos Hulu e Mundo Fox.

A própria maneira de se elaborar um programa televisivo mudou – culpa da web 2.0. A partir do momento em que qualquer um pode gerar conteúdo, a TV teve de abrir espaço para o povo entrar. Perguntas pelo Twitter, sugestão de pauta em blogs, envio de vídeos para o chamado jornalismo cidadão. Hoje a televisão precisa ser interativa e convidar o telespectador para uma criação em parceria.

Uma atração de TV também não pode mais se restringir ao seu meio. Ela precisa gerar um universo ao seu redor, como materiais exclusivos para a internet (como as séries online), redes sociais para interagir com o público e até games de realidade alternativa. Tudo para fazer com que o telespectador se identifique com o produto.

Mas e no Brasil, existe alguma mudança que tenha sido muito forte por aqui? Difícil não se lembrar da questão do tempo de internet. A MTV popularizou no País o formato das atrações com 15 minutos de duração – que foi copiado por várias emissoras mais tarde. O tempo enxuto combina com a fatia jovem da audiência, que assiste à TV sem a devida concentração – vê-se televisão enquanto se manda mensagens pelo celular e checa o Twitter, por exemplo. Além do mais, um programa de tiro curto funciona bem na tela da TV, na do computador ou na de portáteis como celulares e iPod. Na era da superinformação, quanto mais rápido se tiver acesso a um conteúdo, melhor. Vide o sucesso do Twitter.

A televisão de hoje passa pela internet, mas como ela será daqui a 10 anos? O 3D, tão em voga nos cinemas, terá o seu lugar em nossos lares, acredite se quiser. Já existem televisores com tal tecnologia à venda por aqui. Também engatinha no Brasil o mercado de gravadores digitais, populares entre os americanos há quase uma década. O fato de se conseguir gravar programas e filmes rapidamente, sem dor de cabeça alguma, traz uma enorme mudança de comportamento. Nos EUA já existe até uma medição de audiência entre esses gadgtes, batizados de DVR. Alguns programas de lá são mais assistidos gravados nesses aparelhos do que quando exibidos ao vivo, pela TV.
 
Lá, o telespectador já decide quando assistir ao seu show predileto há muito tempo.

Modelos de TV de ponta hoje são integrados à internet, permitindo acesso direto ao YouTube, por exemplo. O futuro está na convergência de mídias e a televisão será a central de tudo – que estará conectado via rede. Quer saber qual é o vestido da personagem da novela das seis? Clique nele com o controle e tenha acesso à loja virtual do folhetim. Parece maluquice, mas vai ser essa a pegada. A TV digital promete essa interação, mas os conversores caros e falta de produção em alta definição fez dela um projeto furado até o momento.

A grande solução para a TV digital, por enquanto, está naquele aparelho que um dia servia apenas para fazer e receber ligações telefônicas: o celular. Acompanhar TV pelo telefone móvel é um mercado promissor. Em lojas de produtos piratas, são populares os aparelhos que sintonizam TV aberta. No oficial, modelos que sintonizam TV digital ganham força e já estão à venda a preços convidativos. Em 2010, em pleno ano de Copa do Mundo, não se assuste ao ver o pessoal andando por aí com as antenas levantadas de seus celulares.

Será só o começo.


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Gustavo Miller: A década em que o telespectador mandou na televisão