O brasileiro Ryoki Inoue é, segundo o Livro Guinness, a pessoa que mais escreveu e publicou livros em todo o mundo. Usando nada menos do que 39 pseudônimos, além de seu próprio nome, ele chegou à marca de 1079 livros publicados, por diversas editoras. Seu recorde, nem de perto ameaçado até hoje, foi alcançado em 1993, com a publicação de E Agora, Presidente?, o número mil de sua carreira.

O envolvimento é tão intenso que, em 1978, ele desistiu de sua profissão original. Há 31 anos o ex-cirurgião de tórax deixou a medicina para se dedicar inteiramente aos livros. E, desde então, se apresenta como um escritor profissional.

Chegando a escrever até seis títulos por mês, às vezes até uma história inteira em uma única noite, ele não se dá sequer ao luxo de escolher gêneros. De biografias a romances, de livros técnicos a histórias policiais, contos, crônicas, vale tudo.

Até porque, para Inoue, com uma pesquisa eficiente, concentração e trabalho disciplinado, qualquer pessoa pode escrever sobre qualquer coisa. A polêmica opinião já o levou a escrever livros (claro) sobre o assunto e a ministrar um curso por email. Ele não dá 100% de garantias, mas aposta que a maioria pode chegar lá.

Leia a seguir a entrevista de Ryoki Inoue ao Virgula.

Como veio a decisão de abandonar a medicina para dedicar exclusivamente à literatura? Nunca sentiu falta de praticar a medicina também?

Formei-me pela FMUSP em 1970, mas continuei no Hospital das Clínicas durante os oito anos seguintes. Quando saí para a “vida”, em 1978, comecei a perceber que a realidade da medicina no Brasil era muito diferente daquilo que vivíamos no mundo acadêmico. Até 1986 trabalhei em vários hospitais, operei muito, dei incontáveis plantões e acabei por concluir que não poderia sentir-me satisfeito.

O sistema de remuneração estava muito aquém do mínimo que beiraria os padrões da justiça e da decência e o nível de responsabilidade cobrado dos médicos era absolutamente desproporcional à segurança que os hospitais e o próprio sistema de saúde conseguiam oferecer. Quando o INAMPS (na época era essa a sigla do INSS) resolveu que as cirurgias que fazíamos não eram de urgência, decidi parar de brincar de médico.

Nessa época, ainda em 86, minha esposa, que é artista plástica, fez uma venda de quadros para uma rede hoteleira do Nordeste, o que possibilitou uma folga financeira significativa. Aproveitando a “onda”, encostei o estetoscópio, comprei uma máquina de escrever e mudei radicalmente de profissão.

Na verdade, não sinto falta de praticar a Medicina, mesmo porque jamais se deixa de ser médico… Sempre há um amigo, um parente ou outro chato do tipo que decide ouvir a nossa opinião. Além disso, os temas médicos continuam a interessar e, por mais que se fuja deles, sempre acaba acontecendo alguma coisa que nos leva a pensar como médicos outra vez.
 
A que você deve essa produção tão prolífica? E toda essa velocidade? De onde vem tanta inspiração?

Você sabe como ganha mal, neste nosso país, alguém que decide viver – sobreviver – única e exclusivamente através de sua produção intelectual. Assim, para manter pelo menos parcialmente o padrão de vida que eu conseguia dar a minha família, enquanto médico, era preciso produzir muito do ponto de vista literário. Daí ser obrigado a escrever muito.

Quanto à inspiração… na verdade, não acredito muito nisso. Quando se toma a escrita como profissão, não se pode pensar em ter o luxo de só trabalhar quando se está “inspirado”. Tem-se, isso sim, de buscar ideias. E estas estão por aí, na vida do dia-a-dia, enchendo as páginas dos jornais e os minutos dos telejornais. Basta saber “pinçá-las” e desenvolvê-las.

Você adota alguma fórmula para escrever um livro? Você oferece um curso sobre um método. Será realmente possível que qualquer pessoa seja capaz de escrever um romance?

Não há uma fórmula pronta para se escrever um romance. Mas há um método de trabalho que eu ensino no curso que ofereço, “Vencendo o Desafio de Escrever um Romance” e que procuro seguir. E acredito que qualquer pessoa – com boa vontade, dedicação e perseverança – consiga escrever um romance, desde que siga esse método adequadamente.

Claro que é preciso ter algum conhecimento de gramática, de ortografia… Mas acho perfeitamente possível, sim. De mais a mais, os revisores, preparadores de textos e editores estão aí justamente para extrair a parte boa do trabalho do escritor.
 
Em relação à diversidade de temas, há algum de sua preferência? Escrever tantos tipos de livros e histórias sempre foi uma opção sua ou isso surgiu a partir de uma demanda das editoras ou leitores? E como você pesquisa os assuntos, em tão pouco tempo?

Prefiro temas que remetam a algum suspense. Daí escrever romances que têm uma séria tendência a serem classificados como “thrillers”. Na verdade, um escritor profissional, como eu, tem de procurar preencher lacunas do mercado editorial. Isto só é possível através de pesquisas de opinião entre os leitores em potencial e através de sugestões de editores e livreiros.

Os pedidos de editores são raros. O último romance que escrevi sob demanda do editor foi Saga, que fiz para a Editora Globo por ocasião das comemorações do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil.

E é ilusão que eu pesquise os assuntos em pouco tempo. Os últimos romances que escrevi são prova disso. Para escrever Quinze Dias em Setembro levei quase um ano pesquisando sobre os atentados às Torres Gêmeas; para o O Fruto do Ventre pesquisei sobre o tema por mais de um ano e, atualmente, estou escrevendo Também se Lava com Água Benta, que já me custou ano e meio de pesquisas sobre os crimes no seio da Igreja Católica nos últimos 20 anos.

Contudo, para os romances “de ação”, as pesquisas de fato são mais rápidas e quando as faço para um livro, a mesma pesquisa pode servir para muitos outros.
 
E como foi sua entrada no Guiness? Quando a marca foi registrada e já há alguém ameaçando seu recorde?

Minha chegada ao Guinness foi por acaso. Jamais imaginei ou tive isso como meta. Em julho de 1992, o então repórter Eduardo Rômulo Bueno, o “Peninha”, apareceu em casa – nós morávamos em Piúma, no ES, nessa ocasião – dizendo que eu tinha batido o recorde mundial de escrever romances.

E a marca foi para o Guinness. Acho que foi o próprio Peninha que comunicou. O Guinness pediu-me, então, que enviasse as cópias dos recibos ou contratos de edição. E passei a figurar no livro dos recordes a partir de 1993.

De lá para cá, ninguém nem mesmo chegou perto de minha marca. Há alguns que alegam ter superado o recorde, mas, nas verificações, constata-se que são short-stories e não romances ou novelas. E eu permaneço.

Sua intenção agora é reduzir significativamente sua produção. Por que? E você acredita que vai conseguir, sem sentir falta de escrever?

Estou com 62 anos de idade… Não faz mais sentido correr, não acha? Além disso, as editoras brasileiras não estão investindo em pocket-books novos, apenas estão transformando em livros de bolso títulos que já constam de seus catálogos e aqueles que já estão em domínio público.

De qualquer maneira, tenho cerca de 300 originais para pockets praticamente prontos para publicação. Se alguma editora se habilitar…

E eu escrevo todos os dias. Por isso, acho que não vou sentir falta de escrever simplesmente por diminuir a quantidade de originais produzidos. Porém, o motivo principal é que estou me dedicando a romances maiores, muito mais elaborados e que exigem pesquisas mais profundas.
 
Há livros disponíveis para download em seu site. Você pretende disponibilizar outros? Como enxerga a questão dos direitos autorais e da pirataria online?

De fato, andei disponibilizando alguns livros (já publicados em papel) em meu site. Tenho pensado muito seriamente em e-books.

Talvez a ideia venha a se desenvolver e a ser posta em prática quando o Kindle (leitor digital para jornais e livros) chegar efetivamente ao Brasil e com preços competitivos. Não tenho a menor dúvida de que o livro digital será a grande solução para o mercado editorial mundial.

Os direitos autorais, no sistema atual, já constituem um sério problema para os autores. Talvez com o livro digital isso venha a melhorar, pois o controle de downloads pode ser mais simples, mais eficaz e mais honesto.

Quanto à pirataria, creio que é algo inevitável. Se hoje é possível fazer xerox de livros, por que não fazer cópias eletrônicas?

Enquanto o ser humano mantiver a ideia de sempre querer levar vantagem, mesmo que para isso preciso ser desonesto, a situação não vai mudar.

Existe alguma obra sua em versão audiobook? Tem alguma intenção de entrar nesse mercado também?

Não pensei nisso, ainda. Mas nada tenho contra a ideia e se alguma editora especializada quiser a minha colaboração, é só fazer contato.


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