Conheci o Hermano Viana em um tarde no Projac. Era o dia da gravação para o Fantástico, de um especial sobre volta dos Paralamas, depois do acidente com o Hebert (irmão de Hermano Viana). Fizemos um projeto na Globo chamdo Brasil Total, no Fantástico. Pedi um texto para ele. Eis o que ele mandou:

Oi Gabriel,você já leu este meu texto?
http://www.overmundo.com.br/banco/o-direito-de-querer-menos-em-pdf
Acho que eu falo tudo que penso sobre o assunto neste texto:

O Direito de Querer Menos

Hermano Vianna

Nos últimos anos, não é mais possível andar pelas ruas de Londres sem se deparar, em todos os lugares, com uma loja de sanduíches da cadeia Prêt-A-Manger, recinto de look pós-moderno onde podemos ter toda uma nova experiência fast-alimentar.

As massas do mundo “desenvolvido” se sofisticaram demais para continuar consumindo hamburgers e coca-colas, mesmo quando estão com pressa. Não fica bem, nem um pouco bem, serem surpreendidas num McDonald’s, que não contente de ter fama de gerador de enfartes ainda é acusado de destruidor de florestas tropicais. Além disso,essas massas já foram doutrinadas a gostar de rúcula, tomate seco e capuccino – portanto seus novos paladares não admitem mais aqueles sabores rudes que um dia encantaram a sociedade de consumo em seus tempos primitivos, pré-digitalizados e pré-globalizados.

Agora todo mundo tem que ter personalidade e bom-gosto – sempre definidos por seu padrão de consumo. O produto de massa contemporâneo vem com outra embalagem, para fingir que não é de massa, para aparentar que foi feito só para você, consumidor especial que sabe o que quer.

Ao ver tanta opulência numa simples lanchonete não pude deixar de suspirar pensando no meu querido e coitado Terceiro Mundo. Aquilo tudo pode existir ali porque em algum lugar do mundo não existe nada parecido. Isso é matemática de primeiro grau. O planeta não tem recursos suficientes para proporcionar esse padrão de consumo de massas para todas as suas massas.

Não cabe no mundo isso tudo para todos. Não que não fosse bom caber. Mas não vai ter Fome Zero mundial que, nas atuais condições tecno-científicas da engenharia agronômica, vá produzir riqueza o bastante para alimentar o desejo de Crayfish e Avocado Salad…

… como seria o trânsito de uma cidade como São Paulo, e os níveis de petróleo no mundo, se todo mundo pudesse ter, como todo mundo parece desejar por razões para mim inexplicáveis a não ser por mero exibicionismo, um Hummer personalizado. Tudo bem, dizem que o carro é bom, dos melhores, já foi testado em guerras no deserto… Eu acredito em propaganda militar e marketing… Mas quem precisa mesmo dele?

Consigo evidentemente admirar a beleza de uma bolsa Vuitton desenhada por Takashi Murakami. Acho bacana, bem potlach, que alguém gaste tanto dinheiro para comprar essa bolsa – adoro ver gente queimando dinheiro, quanto mais dinheiro melhor. Mas também sei que o mundo poderia viver muito bem sem essa bolsa.

Sempre vai ter alguém que tem mais, ou vai ter um produto novo – e glamurosamente caro – que você não tem e não pode ter (e o fato de você não precisar ter não tem a menor importância, quando o desejo de ter é o que move tudo).

O que estou pregando então? Uma comunidade hippie globalizada? Uma nova revolução cultural maoísta? Pretinhos básicos, e nada mais, para todas as moças? Nada disso parece ter dado muito certo, não é? Porque todo mundo está ficando cada vez mais louco ao consumir e não há – até segunda ordem – plano de fuga no shopping center planetário.

Então esta é minha única maneira de terminar este texto com um elegante otimismo: quero apenas menos, um pouquinho menos. Vocês que são brancos, e precisam realmente comprar isso tudo, que se entendam

Como diz o Wando, numa canção que adoro: eu vou ficar quietinho, eu vou ficar no meu canto. Talvez essa seja a atitude mais radical de todas.

Hermano escreveu e publicou esse texto na Folha de Sâo Paulo em dezembro de 2003. Poderia ter escrito ontem. Hoje esse conceito de menos é mais é o pensamento mais atual que podemos ter! Aqui alguns trechos que podem servir para reflexão nessa semana do meio ambiente.

Valeu Hermano!


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O Direito de Querer Menos (entrevista com Hermano Vianna)