Após cantoras e mais cantoras talentosas aparecendo em profusão, neste que era o ano deles, de Marcelo Jeneci, SilvaWado, Cícero, Jan da Silva, Negro Léo, e outros, eis que surge a ribeirão-pretana Verônica Ferriani. Surge, modo de dizer, em 2004, ela apareceu como intérprete ao lado do violonista Chico Saraiva e desde então trabalhou com meio mundo. A novidade é o lançamento do seu primeiro álbum como autora, Porque a Boca Fala Aquilo do que o Coração tá Cheio, disponível para baixar em seu site (aqui). O disco é impressionante e vai dar pano para comparações dispensáveis do tipo “a nova Céu“.

Em turnê pelo Japão, como na música de Gilberto Gil e João Donato, a paz invandiu o coração de Verônica e ela dividiu, em entrevista por e-mail ao Virgula Música, suas impressões sobre o amor do arquipélago que sempre foi e sempre será hype quando se fala em culto à sonzeira. 

“É impressionante o quanto os japoneses ouvem jazz. Arriscaria dizer que a aproximação com a música brasileira veio através desta ponte jazz/bossa-nova, e depois veio o samba e a alegria festiva pela qual o Brasil também é conhecido, e que eu adoro. Creio que por ser uma cultura que cultiva o silêncio, de forma às vezes até religiosa, o cool jazz e a bossa nova encontraram aqui o público perfeito onde reverberarem”, afirma.

O show de lançamento em São Paulo Brasil será no dia 16, no Auditório Ibirapuera. No palco, se apresenta ao lado dos produtores do disco Marcelo Cabral e Gustavo Ruiz – que também assinam a direção musical do espetáculo -, além dos músicos Guilherme Held (guitarra), Sergio Machado (bateria) e Rodrigo Campos (guitarra e violão). Participam do show Alexandre Ribeiro (clarone), Pepe Cisneros (piano suette) e Thiago França (sax).

Ouça Verônica Ferriani

O álbum Porque a Boca fala Aquilo do que o Coração Tá Cheio é seu primeiro autoral, de que maneira o seu trabalho como intérprete foi importante para te dar uma base? 

Mais que tudo, foi importante por criar boas referências de repertório. Mas também por me ensinar a construir uma conexão emocional que não dependesse necessariamente da minha relação pessoal com a canção. Também por me ajudar a identificar o que me instiga ou comove mais, e onde consigo atuar melhor, portanto. De várias formas a experiência como intérprete me guiou quando comecei a escrever, ainda que intuitivamente.

Como intérprete de outros compositores, há tantas músicas incríveis a se cantar que o nível de exigência para nosso próprio trabalho de composição aumenta. Por outro lado, comecei a entender a magia e me sentir instigada com o ganho de personalidade do trabalho ao cantar minhas próprias canções.

Eu não queria compor gratuitamente. Até que pintou uma demanda interna, um assunto, uma inspiração. Eu já estava mais próxima ao violão novamente, instrumento que toco desde criança, e voltava a escrever também, assim foi natural as músicas irem nascendo.

Um passo importante também foi entender que elas formavam um conjunto, que estavam agindo como um disco. Eu vinha fazendo já uma pesquisa de inéditas de outros compositores pra somar às minhas neste disco, mas, já mais próxima do Cabral e Gustavo, vimos que essas realmente faziam mais sentido quando conversavam entre si. Viraram o álbum “Porque a boca fala aquilo do que o coração tá cheio”, frase que tem a ver exatamente com essa prioridade interna que dou à coerência emocional, e o respeito ao tempo de amadurecimento a cada passo.

Se sente parte de uma cena, de que outros nomes da nova brasileira você mais gosta?

Considerando que uma das melhores características da cena hoje é a diversidade e a peculiaridade de cada trabalho, me sinto sim. Até porque, principalmente em SP, há hoje uma concentração de músicos vindos de várias partes do Brasil – eu sou de Ribeirão Preto.

Não à toa chamei pra produzirem o disco Marcelo Cabral e Gustavo Ruiz, nomes bastante atuantes desta geração, que já tinham produzido juntos as músicas de minha participação no Som Brasil (TV Globo, 2007). Mas, ao mesmo tempo, uni-los pela primeira vez na produção de um disco me interessava por serem um tanto diferentes entre si. Eu intuía haver ali uma equação única e interessante, cada um com um lado experimental e uma firmeza musical diferentes; Cabral me conhecendo super bem, Gustavo com uma relação mais nova e sem vícios de convivência.

São muitos discos e trabalhos legais. Adoro principalmente os que conseguem se destacar tendo trabalhos únicos, seja mais como compositores ou como intérpretes. Luísa Maita, Rodrigo Campos, Céu, Karina Buhr, Tulipa, Juçara Marçal, Caê Rolfsen e o próprio Chico Saraiva, com quem gravei um projeto especial em 2009, o Sobre Palavras, são alguns deles.

Os japoneses adoram o Brasil, você que está aí pode falar dessa experiência com propriedade, arriscaria alguma explicação para isso e vê aproximações entre as duas culturas musicais?

É impressionante o quanto os japoneses ouvem jazz. Arriscaria dizer que a aproximação com a música brasileira veio através desta ponte jazz/bossa-nova, e depois veio o samba e a alegria festiva pela qual o Brasil também é conhecido, e que eu adoro. Creio que por ser uma cultura que cultiva o silêncio, de forma às vezes até religiosa, o cool jazz e a bossa nova encontraram aqui o público perfeito onde reverberarem. Ainda é mais fácil chegar aqui com um disco tradicional destes gêneros. Mas, de alguns anos pra cá, eles têm ouvido aqui também alguns sons mais experimentais e difíceis de classificar, da nova geração brasileira. Vir ao Japão cantando exclusivamente as músicas de meu disco autoral é um desafio possível e bem sucedido graças a este alargamento na escuta.

Para quem ainda não conhece a Verônica, como você se apresentaria?

Cantora de nascença, violonista amadora desde os 8, amante da arquitetura e das rodas de samba, artista-compositora saindo da zona de conforto, de coração na mão. Formada na FAU, comecei a cantar em 2004 com Chico Saraiva e, muitos sambas depois, lanço agora meu primeiro disco autoral, Porque a boca fala aquilo do que o coração tá cheio. Mas o melhor jeito de conhecer um artista é vê-lo atuando, em show ou no disco.

Se tivesse que definir sua missão musical, o que diria?

Diria que minha missão musical tem sido essa entrega emocionada ao trabalho, ao vivo no palco ou em estúdio, buscando realmente chegar às pessoas mais profundamente. Qualquer outro tipo de escolha – de sonoridade, linguagem, timbres, técnica – , pra mim deve ter como objetivo auxiliar na construção dessa atmosfera emocional pedida por cada música. Faço música com esse desejo. Menos classificação e mais sentimento vivo.

SERVIÇO

Verônica Ferriani, lançamento do álbum Porque a Boca Fala Aquilo do que o Coração tá Cheio 
Quando: sábado (16/11), às 21h
Quanto: R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada)
Classificação indicativa: livre
Onde: Auditório Ibirapuera, av. Pedro Alvares Cabral, s/n – Portão 2 do Parque do Ibirapuera Entrada para carros pelo Portão 3)
Capacidade: 800 lugares
Telefone: (11) 3629-1075


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