Eric Clapton em São Paulo - 12/10/2011


Créditos: Marcos Hermes/Midiorama

Ninguém pode negar que Eric Clapton já teve muitos problemas na vida. Com as drogas (foi viciado em cocaína), com as mulheres (se apaixonou por mulheres de melhores amigos), com a família (nunca conheceu o pai). Agora, se tem uma coisa com a qual Clapton nunca pareceu ter problemas é em conduzir um show impecável, com pirotecnia e afetação perto de zero.

Foi assim, eficiente ao extremo, sua apresentação nesta quarta-feira de feriadão em São Paulo. Aos 66 anos, armado durante boa parte do show de uma novíssima Fender Stratocaster (nada de caríssimos e raríssimos instrumentos vintage) que qualquer mortal poderia comprar na Teodoro Sampaio, Clapton fez entender por que até hoje é chamado de Deus. Até São Pedro colaborou e segurou lá em cima a chuva que armava cair durante toda a tarde.

Clapton e sua enxuta banda de dois tecladistas, baterista, baixista e duas backing vocals subiram ao palco montado no estádio do Morumbi às 21h em ponto, atitude não apenas britânica, mas educadíssima. Ninguém merece ficar horas esperando por um show, mesmo que seja de Deus!

Sua atitude basicona vem registrada desde a falta de pompa do palco à composição de seu figurino. Vestindo jaqueta e calça jeans, este senhor de 66 anos mostrou com as pontas dos dedos por que é um dos caras mais reverenciados do mundo quando o papo é guitarra.

O show abriu com Key To The Highway, primeira música em que ele assumiu vocais ao lado de John Mayall na banda Blues Breakers, isso em meados da década de 1960. O hino Hoochie Coochie Man, de Muddy Waters, vem logo na primeira parte do show para situar o cidadão comum que aquilo ali não é um mero show de rock, mas uma aulinha elementar de blues.

Em Old Love, de 1990, Clapton se permite solos mais demorados e inspirados. Gancho para o comentário de uma vizinha de setor “nossa, ele manda muito bem na guitarra”. Bem, eeeeer… é o que estávamos todos lá pra ver, e o único ofício deste britânico há mais de de meio século. 

Até a farofa Tearing Us Appart, da pior fase da carreira de Clapton, ganha força quando tocada ao vivo por uma banda tão eficiente. Lay Down Sally antecede Layla em sua versão mela-cueca, hit do disco Unplugged. É a deixa pra ir ao banheiro ou tomar uma cerveja. Quem queria a pegada da gravação original do álbum Layla, que tinha Clapton e Duane Allman dividindo as guitarras, ficou na vontade. Mas o povo do Morumba aprovou!

A belíssima Wonderful Tonight proporciona aquele momento pra acender isqueiros – ou celulares, né? A música do disco Slowhand, de 1977, é simplesmente a lenta perfeita para estádios. Acalma, revigora, desce macio, parece conhaque. Casais se amassam. O povo aplaude. E as backings fazem aquela coreografia de chacrete que a gente adora.

Before you Accuse Me começa com uma introdução diferentona. A voz de Clapton está calejada no ponto perfeito pra cantar esse tipo de blues rasgadão. Até o friozinho do Morumbi parece diminuir.
Só estranha a atitude de não abrir espaço no show para dois músicos monstros de sua banda, o baixista Willie Weeks e o baterista Steve Gadd. Ao contrário do que fez com os tecladistas da banda, que tiveram a chance de fazer solos e aparecer, Weeks e Gadd foram tratados como meros músicos de baile de formatura. 

Cocaine vem numa roupagem anos 90, apoteótica, pra tocar em estádio. Só faltou o Phil Collins na bateria. Fim de show, momento de ir pro camarim tomar uma água (Clapton está “limpo” desde meados dos anos 80).

Para o bis, Clapton volta com o americano Gary Clark Jr., seu apadrinhado talentoso, responsável pelo show de abertura no Morumbi e também nas outras datas da turnê brasileira (que passou pelo Rio e Porto Alegre). Os dois se divertem tocando juntos. Clapton sorri largamente pela primeira e última vez no palco. 

Sâo quase 23h quando Crossoroads, a única música do bis, chega ao fim. Lá se vão pouco mais de 100 minutos de show e nenhum mísero “Oi, São Paulo”. Ficamos com alguns secos “thank yous” e mais nada. Mas assim é Deus, e se o cara não quer falar, não vejo problema nenhum. Porque eu também não fui até lá pra bater papo, afinal.

SETLIST

Key to the Highway
Tell The Truth
Hoochie Coochie Man
Old Love
Tearing Us Appart
Driftin’
Nobody Knows You When You’re Down and Out
Lay Down Sally
Layla
Badge
Wonderful Tonight
Before you Accuse me
Little Queen Of Spades
Cocaine

BIS

Crossroads 

Colaborou Eduardo Assef


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Eficiente, Clapton prova que ainda é Deus no Morumbi