Naldo Benny

Reprodução/Instagram Naldo Benny

Naldo Benny foi buscar referências em suas raízes para #Sarniô. O nome vem de uma gíria da Vila do Pinheiro, comunidade onde nasceu, no Complexo da Maré, no Rio, e as referências à negritude vão desde sonoridades que remetem ao R&B, como a gaita de Milton Guedes em Meu Bem, primeira faixa do disco, que soa como ninguém menos que Steve Wonder. É possível pescar também ecos de outros ídolos da música negra como Tim Maia, Barry White e Michael Jackson, em um caldeirão onde entram bossa, MPB, samba e gospel.

O disco, no entanto, tem dois pontos altos, a capa de Romero Britto e a participação de Mano Brown, dos Racionais MC´s. Tanto um quanto outro receberam críticas. Sobre o artista plástico, Naldo desabafou ao Virgula: “Eu fico indignado quando as pessoas falam mal porque o cara merece respeito. Acima de tudo é um vencedor, um brasileiro, é gente nossa”.

Gif Naldo

Já o rapper partiu para o ataque. “Como o público do Racionais ficou muito careta, muito engessado, tenho que fazer por fora. Sou obrigado a fazer. Não que eu queira quebrar o grupo ou sair dele”, disse ao jornal O Globo. “Esse movimento careta não me agrada. Quando comecei a fazer essa porra, fiz para ter liberdade. Não para ser carcereiro de ninguém. Os caras são carcereiros, eu sou ladrão. Pulo o muro e vou embora. Gravei com o Naldo e “roubei a brisa” deles. Não sabem nem o que falar”, completou.

Leia nossa conversa exclusiva com Naldo, que falou sobre as polêmicas, suas origens e referências, entre outros assuntos.

Como foi que surgiu a ideia da capa do Romero Britto?
Naldo – Uma vez eu encontrei com ele em Miami nos Estados Unidos, já era fã dele desde moleque, sabia quem ele era. Aí falei que era fã, ele ficou felizão. Ficamos amigos. Aí, ele falou, pô, você tem umas peças minhas caras e tal, você é meu amigo, você é sangue bom, vou te dar um presente’. Aí, eu falei, pô, Romero. Eu não quero que você me dê uma obra pra eu colocar em casa, não, quero que você faça a capa do meu CD novo. ‘Tá combinado’, ele falou e fez. Eu fico muito feliz que o Romero é um cara que merece todo respeito. Ele é um cara que tem essa importância pelo mundo. E ele fez não só o meu retrato, mas ele fez do Luan Santana, que é um grande artista também, já fez Obama, Marilyn Monroe, Madonna, Michael Jackson, e e eu tô no meio, entendeu.

Paulo Coelho…

Paulo Coelho, só peso pesado. E eu ali no meio. Fico feliz com isso. E eu acho que o Romero merece respeito, a galera do Brasil fala besteira, fala merda quando critica o cara. O Romero é um cara que venceu. Veja bem, você tem um parente que vai pros Estados Umidos pra vencer, pra fazer a vida, você sabe como é, a galera vai pra lavar prato, fazer umas paradas assim. Mas mesmo assim você torce pelo amigo, né? Pô, tomara que ele consiga. Por quê a gente não vai torcer pro Romero que é bem sucedido, que representa o Brasil com a arte? É uma arte pop e eu tenho o meu som pop. Eu fico indignado quando as pessoas falam mal porque o cara merece respeito. Acima de tudo é um vencedor, um brasileiro, é gente nossa.

Fiquei muito feliz com essa capa. Ele é meu brother, a gente fala pelo telefone, joga peteca junto, brinca.

Queria que você falasse um pouco de Benny e Brown, parceria sua com o Mano Brown. Em que ponto vocês se identicaram, o fato de serem negros, a origem humilde?
Naldo – O caminho é isso, né, cara, favela, a gente veio de lá. A gente vem do gueto mesmo, a gente é preto e têm orgulho disso, levanta a bandeira do som negro, do funk, rap, black music.

Encontrei com Brown lá no Sul, no Planeta Atlântida, e eu pedi que ele falasse com meu filho, que é fã dele, pelo telefone. Aí, ele curtiu a onda. Eu falei, pô, eu sou o Naldo e ele: ‘Eu tô ligado, você faz uns negócios de dança, faz uns esquemas de som dançante’. Aí ficou isso. Depois a gente falou por telefone, ele topou gravar comigo, e aí começamos a fazer. A gente se encontrou de 15 a 20 vezes, no mínimo.

Naldo Benny

Divulgação Naldo Benny

E como ele é pessoalmente, ele é um cara sério, sisudo?
Naldo –  Autêntico, ele é autêntico. Um cara que tem um coração lindo, gigante, ao mesmo tempo que tem sua característica dura também. Tem o seu lado amoroso de ver a vida. É meu irmãozão hoje. Temos um carinho, um respeito gigante um com outro. E ele foi muito cuidadoso também com o som. A gente se encontrou algumas vezes nem pra escrever, mas pra falar sobre o que a gente ia escrever, com muito cuidado. Ele vestiu a camisa do som e curtiu fazer porque era diferente do que ele já tinha feito. É um cara muito inteligente, embora outros surjam aí, ele é o número um do hip hip da cena nacional, na minha opinião.

Teve gente que criticou o Mano Brown por fazer esse trabalho contigo, você acha que o pessoal não consegue enxergar muito além do que está acostumado?
Naldo –  Além da ponta do nariz, né? É, a polêmica pra existir é um espirro.

Naldo Benny

Reprodução/Instagram Naldo Benny

Nos Estados Unidos, é comum artistas do pop se juntar com um do rap. As críticas no Brasil são resultado de um pensamento limitado?
Naldo – No Brasil tem gente que não consegue ser aberta, não consegue ser descolada. O Brown é um cara inteligente, antenado, um cara que virou pra mim e falou, ‘Pô, você fez um DVD louco, sua onda dançante é muito maneira, quero ir em um ensaio de dança, quero ver como que é’.

Isso é uma coisa legal de você, você foi b-boy, quando você vai fazer uma música você pensa como que o som vai ser dançado?
Naldo – Penso nisso. O show é altamente dançante. O Brown tem um intecto altíssimo e ele não ficou parado no tempo. Dentro do estúdio, ele ficava me dando ideia, o que eu canto, fui eu que escrevi e o que ele canta foi ele que escreveu. A gente fez tudo lá em casa, no estúdio lá. E ele dizia: ‘Pô, escreve o que você gosta de usar, o que você gosta de calçar, o perfume que você gosta de usar, como que é na tua área, o carro que tu curte, isso vai aproximar a molecada da gente, a rua é isso aí’.

Ele deu tipo um workshop?
Naldo –  É. Foi uma grande influência, ele é um cara incrível, muito talentoso, foi muito bom fazer.

Naldo Benny

Reprodução/Facebook Naldo Benny

E o Erasmo, que também participou do disco?
Naldo –  Aproximou com uma coisa que eu tenho desde criança, com Roberto Carlos, Erasmo Carlos. Tenho um sonho de gravar o especial de Natal com Roberto Carlos algum dia. E eu só tenho a agradecer ao Eramos Carlos por ter ido gravar. Ele também foi lá em casa, aprendi muito com Erasmo, ele também é um talento e eu fico muito feliz. Ele assinou, carimbou o meu trabalho.

O que você acha que tá acontecendo de mais novo na música brasileira hoje?
Naldo –  Acho que a nossa cena é um som faz um 360, toca no rádio, na festa, na balada, na TV, tem uma força na rede social. O nosso som é pica. ‘Dois preto de BM, Benny e Brown, Brown e Benny…’

Você optou por trabalhar com o Batutinha, assinou a produção junto com ele.
Naldo – Isso, meu brother, esse aí é meu irmãozão, um cara talentoso pra caramba. Um gênio. Esse aí não copia. É por isso que a gente se dá tão bem. A gente não gosta de copiar, a gente gosta de criar. Aí que causa essas polêmicas todas porque novo é novo. Mas se for pra apanhar, a gente vai apanhar, a gente não tá nem aí.

Naldo Benny

Reprodução/Facebook Naldo Benny

No seu livro Cada Vez eu Quero Mais você conta as histórias trágicas do seu irmão e do Claudinho, ter passado por isso influenciou você ter se tornado quem é hoje, te ajudou a batalhar com mais garra?

Naldo –  Me deu força, me fez ser mais duro. Primeiro a minha origem, a gente já tem que ser forte vindo de lá. Depois, essas pancadas todas, a gente acaba tendo que ter mais força pra entender que muita gente depende de mim. Eles também desejavam isso. Eu tenho a fé, sou um cara otimista. Aprendi muito com a minha mãe a ter fé, tenho Deus comigo o tempo todo, meu irmão me ajudando, Claudinho era um amigão também. Por isso que em todos os meus projetos eu gosto sempre de voar mais alto.

Quantas pessoas você emprega hoje nesse seu lado empresário?
Naldo –  Mais de 50, mais de 50 famílias dependem do que eu faço.

De que maneira sua origem, na Maré, influencia e aparece na sua música?
Naldo – Eu priorizo o funk, usar boné, dançar, usar tênis, eu gosto de ser da favela, eu sou do povo. Meu som, graças a Deus, conseguiu ser híbrido, ir de um lado pra outro. Mesmo quando eu vou em restaurante chique, eu gosto de ir de bermuda e boné. Eu gosto de ouvir hip hop alto, de música boa. E amo fazer meu som com banda. Veja bem, eu canto uma música da Alicia Keys nos shows. Isso tudo tem a ver com a black music. A black music nada mais é que como se fosse o funk dos Estados Unidos. O funk do Brasil é o hip hop lá.

Você chegou a cantar em igreja?
Naldo –  Com sete anos de idade.

É sua escola?
Naldo – Total. Com sete anos comecei a fazer terças nos corais infantis. Minha família e minhas irmãs botavam pra escutar Michael Jackson, Tim Maia, Sandra de Sá, Stevie Wonder, RPM. Aí minha mãe ouvia Marilene Santiago, Shirley Carvalhaes, Euzi Pereira… só as crioulas gospel, minha mãe ouvia muito essas coisas.


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"Fico indignado quando as pessoas falam mal do Romero Britto", diz Naldo Benny