Titica


Créditos: mifa

Titica não sabe quem é Björk, mas Björk conhece muito bem o trabalho de Titica. Nascida em Angola como Teca Miguel Garcia, a cantora adotou seu nome feminino quando veio ao Brasil para implantar próteses de silicone, em 2009.

Aos 25 anos de idade, Titica é muito mais do que um ícone gay ou uma transexual bem sucedida. Ela é o novo rosto do kuduro, um gênero nascido na periferia de Luanda, que mistura dança, rap, batidas eletrônicas e ritmos da cultura local como o semba e a kizomba. No Brasil, o ritmo tornou-se o hit do verão com a faixa Dança Kuduro, do cantor Latino, e abriu os ouvidos do país para o gênero. 

Nomeada Melhor Artista de Kuduro em 2011, Titica quebrou as barreiras do preconceito em um país marcado pela intolerância [ainda é crime ser homossexual em Angola] ao receber o prêmio das mãos do presidente José Eduardo dos Santos. Apesar do tabu, a bailarina vem colecionado fãs e desperta muito mais interesse por sua arte que por sua sexualidade.

Sua música é tão original, que a angolana foi citada em uma recente entrevista de Björk ao jornal The Guardian como uma das influências para seu trabalho atual. Mais do que derrubar paredes dentro de seu próprio país, Titica vence barreiras culturais.

“Eu são sei quem ela é, mas estou muito feliz por isso. Saiu em uma revista americana?”, disse a cantora em uma sincera entrevista ao Virgula Música. Com educação em balé, Titica se envolveu com o ritmo ainda como bailarina de artistas populares da cena local como Noite & Dia e Própria Lixa.

De bailarina a interprete

“Comecei como bailarina, depois resolvi cantar. É muita responsabilidade. Você precisa estar sempre preocupada com a mensagem que está passando para as pessoas. Kuduro é responsabilidade. Muita gente o usa como um refúgio para as drogas. Ele afasta muitos jovens dessa vida”, conta.

“O kuduro começou nos guetos, que é como chamamos as favelas no meu país. Por isso é feito para as pessoas refletirem, protestarem e, é claro, se divertirem. Ele começou como uma dança, por isso também é composto em cima de ritmos e batidas, feito para festejar”.

Os ídolos, o forró e o funk

Björk é fã de Titica, mas quem são os ídolos dela? “Gosto muito de Beyoncé, Rihanna e Ary [famosa cantora angolana de kizomba, com quem gravou o hit Olha o Boneco]. Também gosto muito de Ivete Sangalo, ela é o máximo”.

Então você gosta de música brasileira? “Eu amo Ivete Sangalo. Queria gravar uma música com ela. Também gosto do Latino e de forró. Conheço um grupo chamado Aviões do Forró. É uma música para dançar coladinho, gosto do ritmo. Tem também aquela mulher, a Tati Quebra Barraco, que canta uma música que fala ‘agora eu sou solteira e ninguém vai me segurar’, é muito bom.”

Já ouviu o funk carioca? “Sim, sou doida por funk. Fui a um baile e é muito parecido com as raves [como são conhecidas as festas de kuduro em Angola]. As roupas, as danças, as batidas. A única coisa que não se parece muito são as letras. O funk é mais cantado, e o kuduro mais ritmado, como o rap. No Brasil eu percebi que os homens só cantam, mas lá em Angola todo mundo dança.”

Violência e preconceito

Surpreendentemente tímida para uma extravagante artista, Titica evita comentar sua sexualidade. Mas confessa que já sofreu muito preconceito. “Apanhei, fui apedrejada e julgada. Hoje muita gente me respeita, mas meu país é preconceituoso. Atualmente a homofobia por lá é uma poeira perto do que já foi um dia, mas muita gente ainda tem a mente fechada”. Em Angola, uma nova lei criminalizando a homofobia está inclusive para ser aprovada no Parlamento.

Você acha que a fama pode te levar a ajudar pessoas que estão na mesma situação que você esteve um dia? “Eu já ajudei muita gente e vou continuar ajudando. As pessoas precisam amar a Deus em primeiro lugar, e em seguida ter muito amor próprio. Se nos fossemos obra do demônio como dizem por aí, Ele não me ajudaria a chegar até aqui”, finaliza.


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"Fui espancada e julgada", conta Titica, cantora transexual sensação do kuduro