Testemunha de vários momentos políticos que marcaram a história do Brasil nos últimos 50 anos, o cantor Milton Nascimento disse estar emocionado com os protestos no país e comentou que o povo passou a “cobrar” do governo problemas como “corrupção e omissão”.

Milton elogiou as manifestações em entrevista e admitiu que não esperava que algo com tamanha proporção ocorreria no Brasil após a queda do então presidente Fernando Collor, que renunciou depois que milhares de pessoas saíram às ruas para pressioná-lo por conta de um escândalo de corrupção.

“Estava em Curitiba, onde participei de um evento com estudantes e professores universitários, quando percebi tudo o que estava ocorrendo no país. Achei que depois da renúncia do Collor isso não voltaria a ocorrer no Brasil”, disse.

“As pessoas que estão nas ruas sabem muito bem o que necessitamos. Na verdade, sabemos há séculos. A exploração, a corrupção e a omissão… tudo segue igual desde que estas terras foram ocupadas. Não é novidade para ninguém. Só que agora ocorreu o que os políticos não esperavam: o povo está passando da conta e, mais importante, vai cobrar caro por isso”, acrescentou.

As manifestações, que começaram em São Paulo contra os aumentos das tarifas no transporte público, se estenderam a todo o país e ganharam novas reivindicações, como melhorias na saúde e na educação, e críticas à corrupção e aos altos custos para realizar a Copa do Mundo de 2014.

Os protestos tiveram seu auge na quinta-feira, quando cerca de 1,2 milhão de brasileiros se manifestaram em 100 cidades, e ainda não pararam apesar das principais cidades já terem anunciado a redução no preço das passagens de ônibus e o convite ao diálogo feito ontem pela presidente Dilma Rousseff.

O cantor lembrou que, desde o começo de sua carreira, sempre se envolveu em temas políticos e sociais e que por isso se identifica com os protestos.

“Se diz muito pouco, mas minha militância começou ainda durante a ditadura (1964-1985), quando viajava por todo o país para fazer apresentações em universidades e apoiar o movimento estudantil mediante minha atuação como músico, inclusive em centenas de manifestações”, afirmou.

“Eu não poderia ajudá-los fora do Brasil, por isso que decidi ficar aqui durante os 20 anos da ditadura”, acrescentou, ao lembrar que vários outros músicos preferiram o exílio quando começaram a ser perseguidos.

O cantor lembrou que o período foi muito difícil, especialmente pelas perseguições e o cerco que sofria, e que chegou a dizer que do Brasil só sairia morto.

Milton lembrou também outros momentos em que esteve envolvido como militante, como o projeto Missa dos Quilombos, em 1982, quando uma inédita aliança entre o episcopado da Igreja Católica e os movimentos de defesa de negros, índios e camponesas que lutam pelos descendentes dos africanos no Brasil.

“Também atuei na campanha das Diretas Já (movimento político para pedir que a ditadura convocasse eleições diretas para presidente) e até na luta contra o apartheid na África do Sul”, assegurou.

Milton acrescentou que sua última ação como militante foi em um evento no estado do Mato Grosso do Sul a favor dos índios Guarani, que considerou um dos povos mais explorados em toda a história da América Latina.

“Sempre que vejo algo pelo qual vale a pena lutar, me inscrevo”, assegurou.

Além de Milton Nascimento, muitos outros artistas e personalidades manifestaram apoio às manifestações.

Já o músico Otto assegurou que enquanto as manifestações de 1992 eram para derrubar um Governo corrupto, as de agora são para “tirar a corrupção do poder”.

O cantor Caetano Veloso manifestou em seu blog sua identificação com os manifestantes e disse que os protestos estão dando voz aos sentimentos ainda não articulados, mas servem para os brasileiros pensarem.

“Viva a democracia. Finalmente o povo brasileiro despertou e resolveu tomar para si o poder que é seu. Sonhei com este momento”, afirmou a cantora Daniela Mercury em sua conta em Twitter.

Daniela Mercury citou a música “Canção com todos”, famosa na voz da cantora argentina Mercedes Sosa: “Todas as vozes, todas, todas as mãos todas, todo o sangue pode ser canção no vento, canta comigo, canta, irmão americano”.


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'Povo está cobrando o governo', diz Milton Nascimento sobre protestos