Divulgação Eduardo Brechó

Eduardo Brechó tem em sua banda, a cada vez mais famosa Aláfia, uma verdadeira resistência da música, cultura e religião negra, enaltecendo nas canções que produz e comanda n grupo os elementos que fazem dessa área o que ela é, assim como atraem a depreciação sistemática e preconceituosa do mercado fonográfico.

Divulgação A banda Aláfia

Imerso nesse mundo desde sempre, Brechó e o conjunto formado por ele, Xênia França (voz), Jairo Pereira (voz), Alysson Bruno (percussão), Pedro Bandera (percussão), Lucas Cirillo (gaita), Pipo Pegoraro (guitarra), Gabriel Catanzaro (baixo), Gil Duarte (trombone e flauta), Filipe Gomes (bateria) e Fabio Leandro (teclado) expandiram a visão para a cidade de São Paulo, onde residem, como um todo em São Paulo Não é Sopa, novo CD da banda e um projeto que vem bem a calhar em época de discussão em cima do conceito de cidade linda, arte urbana e coisas do tipo.

Nesse papo com o Virgula, o músico falou sobre isso, João Dória, atual prefeito paulistano, democracia cultural, racial, Grammy, Adele e Beyoncé. Os principais trechos dessa conversa você confere abaixo:

Cidade Linda, Dória e arte urbana

Gabriel Quintão Grafites da 23 de Maio, em São Paulo, antes de serem apagados

A concepção do álbum e a diretriz que deu a lógica vem de antes do [João] Dória ser eleito, mas esse espírito que elegeu o Dória já estava na janela. Faz uns dois anos que nós temos sentido essa onda conservadora na nossa cidade e no país e o Aláfia contesta e combate isso.

Sobre utilização do espaço urbano e da arte, ele (Dória) está expressando mais ou menos o que essa elite pensa, né, e está atentando contra o patrimônio cultural da cidade. Acho que a cidade tem que ser frequentada pelas pessoas. O disco foi feito pensando nessa frequência, por ser uma cidade que é frequentada por nós. Eu frequento a cidade de maneira bem ampla e vejo movimentos de resistência que, a despeito do que o governante possa entender por certo e errado, lutaram, lutam e respiram.

A visão de São Paulo do Aláfia em SP Não é Sopa

Não podemos ter a presunção de dizer que comportamos todos os cantos da cidade. A princípio a proposta era essa, fazer um recorte geográfico em que tivéssemos, no mínimo, 10 regiões, e que chamássemos pessoas dessas regiões para falarem sobre elas. Depois, achei que esse recorte estava meio frio, que estava faltando uma certa espontaneidade, e aí peguei umas canções que eu já tinha que falavam de regiões que eu já tinha alguma vivência e preferi trabalhar com essas, cujas as relações eram mais sinceras e intensas do que o recorte primeiro, entende? Então foi um trabalho que começou de um jeito e terminou de outro por causa disso, por causa dessa opção mais calorosa. Então nós convidamos artistas que se identificam com os bairros em questão e com os temas da música. São bairros que eu tinha um relacionamento e já tinha composto para essas regiões, Bela Vista, Capão Redondo…

George Clinton, Racionais, Moacir Santos e as inspirações do Aláfia 

Divulgação George Clinton é uma das inspirações do Aláfia

As referências do Aláfia são as mesmas. Nós gostamos muito de George Clinton, Racionais, Moacir Santos, e outras coisas mais. Para o SP Não é Sopa, quisemos sair um pouco da zona de conforto daquela linguagem que, a princípio, estava sendo conhecida como funk candomblé, né, que o Corpura pra mim foi o ápice disso. E pra falar de São Paulo eu não poderia forjar ‘ó, São Paulo tem essa sonoridade’. Eu não acredito nisso. Uma coisa é a sonoridade do Aláfia, outra é o Aláfia falando sobre o som de São Paulo. É uma intersecção das duas coisas. E aí que veio a grande inspiração, que é a própria cidade.

A luta contra o racismo na indústria fonográfica 

Divulgação Eduardo Brechó

Existe racismo em todos os aspectos e todas as instâncias da nossa sociedade. No mercado fonográfico é igual. Se você pegar todas as cantoras brancas e as grandes cantoras pretas e comparar os cachês… né? E, por um lado, algumas mídias de “boa música” preterem a música negra. É engraçado porque o soul americano tem o seu espaço nessas mídias, já a música que se coloca como preta no Brasil paga um preço por falar dessa maneira. A identidade afirmativa ainda choca porque o país ainda tenta se identificar como democracia racial. Então, se você faz um recorte específico, você acaba pagando um preço por estar indo contra o que seria a busca cultural estabelecida e imposta, que foi construída e está sendo adquirida ao longo desses [últimos] 200 anos.

Depreciação da música negra no Grammy, boicote e Beyoncé 

Divulgação Beyoncé no Grammy 2017

Embora o mercado americano seja muito diferente do brasileiro em termos de acesso e dos milhões de dólares que os pretos americanos têm, além da influência deles na mídia geral, embora haja essa diferença, a gente nunca diz que quando um negro acusa racismo ele está se vitimizando, ou apelando, ou fazendo alguma coisa em relação a teorias de conspirações paranoicas. Esses dados têm que ser averiguados, questionados, porque as consequências do racismo no ocidente são vistas até hoje na sociedade americana também. Então não tem como achar que isso não é possível. Infelizmente, eu não conheço a fundo o disco da Adele, mas acho muito importante se questionar sim, sempre, quando uma coisa dessas acontece. E a partir dos critérios da premiação, isso tem que ser levado a fundo, é importante que artistas se posicionem. Esse é o grande barato dessa situação. Independente de ter ganhado o Grammy ou não, a Beyoncé vai continuar sendo a referência que ela já é para as meninas daqui e de lá, é um fenômeno muito importante.

11 mulheres negras que já foram vítimas de racismo

Na página do Jornal Nacional no Facebook, internautas ofenderam a raça da apresentadora e um deles se referiu à Maju como escrava: "Onde compro essa escrava? Na época, o caso gerou revolta nas redes sociais e William Bonner e Renata Vasconcellos saíram em defesa da jornalista.
Créditos: Reprodução / Instagram

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Racismo, Beyoncé e "cidade linda": um papo com Eduardo Brechó sobre democracia cultural

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